terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Noções históricas sobre a Missa


A PALAVRA MISSA . O primeiro nome dado ao Sacrifício eucarístico é aquele da fração do pão (Atos 20: 6-7). S. Paulo o chama também como Ceia do Senhor, às vezes comunhão. O nome que prevalece entre os orientais é Liturgia ou serviço divino, e Missa, ou Reenvio, no Ocidente.

 A Igreja permitia que os catecúmenos e os penitentes assistissem as instruções e as orações, mas tinha o cuidado de retirá-los do templo e reenviá-los quando se começava a oblação do santo Sacrifício, eis o que fez chamar o oficio divino de Missa ou Reenvio. .É certo, diz Bossuet, que não havia nada no Sacrifício que marcasse mais a atenção do povo. É ele que oferece os nomes, e ele os dá porque os baliza, e é porque se anunciava esse reenvio solenemente por três ou quatro vezes, que chamavam o Sacrifício de missa, somente no singular, mas também no plural missae.


 LÍNGUA LITURGICA . Nosso Senhor, celebrando pela primeira vez no cenáculo, emprega a língua falada em seu tempo, o siríaco, que os maronitas conservaram em sua liturgia. Os Apóstolos e seus primeiros sucessores celebraram na língua vulgar das nações recém convertidas, que não entendiam outra língua que não a sua. No Egito, era o copta, o armênio na Armênia, e no império romano o latim, a língua universal do Ocidente.

 Como todas as coisas desse mundo, as línguas estão submetidas às variações, e, por isso, a Igreja, sempre sábia, não quis sujeitar a língua da oração pública a essas mudanças. Refutando em sua liturgia as mudanças que sobressaem nas línguas dos povos, ela se ateve constantemente aos textos primitivos.


Prudente sabedoria que nem sempre se soube compreender, pois a majestade de nossos mistérios não se prestou às mudanças sucessivas que se produzem na língua humana. Caso contrário, no lugar de exercitar a piedade, as palavras da liturgia provocariam o riso.


 Se a língua litúrgica seguisse o curso móvel das variações da língua ordinária, seria preciso, constantemente, submeter a novas traduções os livros de oração pública.


 Inconveniência, de um lado, para o fiel, e do outro, trabalho incessante imposto à Igreja para prevenir os erros que poderiam se insinuar nas traduções das línguas novas. Quem ignora que os arianos, pela mudança de uma única e pequena palavra no símbolo de Nicéia, escorregaram em um erro capital que foi a fonte de numerosos problemas na Igreja!


 A comodidade da língua conserva a catolicidade da fé. Ela mantém uma comunicação doutrinal mais fácil entre as diversas igrejas do mundo, e as torna mais ligadas ao centro da unidade católica. Se os gregos e os latinos tivessem somente uma língua, o cisma teria sido facilmente consumido? Não teria sido assim tão fácil para Photius arrastar para a revolta toda a Igreja grega, atribuindo à Igreja romana erros que ela jamais conheceu e abusos do qual ela jamais foi culpável Isso que dissemos dos gregos, podemos dizer também para os russos. Se a língua latina fosse a língua de Moscou, ela teria, talvez, retido os eslavos na hora em que eles se lançaram nos braços dos gregos vexados.


 Toda língua viva, diz de Maistre, pouco convém para uma religião imutável. Como a marca, os gestos, a língua, e até os hábitos de um homem sábio anunciam seu caráter, é preciso também que o exterior da Igreja católica anuncie seu caráter eterno e invariável.


 O que dizer, contra essas razões, a objeção corriqueira do uso de uma língua incompreendida pelo povo?


 Incompreendida, não. Ignorada, sim. Mas pela falta de quem? Aquele que não entende a Missa e o Ofício é bem capaz para aprender o latim. Este é o voto da Igreja.


Quanto ao povo, propriamente dito, acrescenta de Maistre, se ele não entende as palavras, é tanto melhor. O respeito aí ganha, e a inteligência não perde nada. Aquele que não compreende, entende melhor que aquele que compreende mal. Forneceu-se, além do mais, para todas as orações da Igreja, traduções. Umas representam as palavras, e as outras o sentido. Esses livros, em número infinito, se adaptam a todas as idades, a todas as inteligências, a todos os estilos. Certas palavras marcadas na língua original e conhecidas de todos os ouvidos, certas cerimônias, certos movimentos, certos sons advertem o assistente, até o menos letrado, do que se faz e do que se diz..


 Hoje fazem uma nova objeção. Recitando, dizem, orações ou cantos em uma língua desconhecida, como as pessoas poderiam ser iluminadas pelas chamas da devoção? Achamos em um Padre da Igreja a resposta para esta dificuldade: Há coisas que parecem obscuras, mas que ao fazê-las entrarem em nossos ouvidos, trazem, contudo, uma grande utilidade para nossa alma. As Virtudes celestes e os anjos de Deus que estão conosco, como o Senhor o ensinou por sua Igreja sobre os pequenos filhos, alegram-se ouvindo sair de nossa boca, como piedosos encantamentos, as palavras da Escritura e os nomes que ali se leem. Se não compreendemos as palavras que profere nossa boca, essas Virtudes que nos assistem, as ouvem, e, convidadas como por nossos cantos, se atiram, se prestando a chegar até nós e nos trazer o socorro..


 DIA DA CELEBRAÇÃO DA MISSA . Ele surge, evidentemente, dos Atos e das Epístolas dos Apóstolos, que afirmam que a fração do pão ocorria aos domingos. Mais tarde, na África, esse privilégio se estende à quarta-feira e ao sábado, em honra dos mistérios dolorosos que se cumpriram nesses dias. Também se diziam a Missa nos dias dos mártires, e, talvez, é preciso, por isso, atribuir a Missa cotidiana graças ao número sempre crescente de fieis mortos pela fé e que se honravam pela oblação sagrada.


 Em várias Igrejas, sobretudo na Ásia menor, como não se trabalhava tanto no sábado como no domingo, a Missa era celebrada nesses dois dias. O culto de Maria também teve seu berço nos lugares onde ela habitou sob a guarda filial de S. João, e este apóstolo propagou com zelo, em Éfeso e nos territórios vizinhos, a devoção pela Mãe de todos os homens.


 Esses diferentes dias da semana são ainda, da parte da Igreja, objeto de uma veneração especial.


 HORA DA CELEBRAÇÃO DA MISSA . Sobre esta questão, havia, no princípio do Cristianismo, uma grande variedade. O Salvador tendo celebrado a Ceia eucarística sobre o entardecer, foi seguido pelos Apóstolos. A celebração da Missa era então ordinariamente precedida de uma refeição fraternal nomeada ágape. Em lembrança daquela no qual


 Nosso Senhor participou com os seus, antes de dar seu corpo e seu sangue adorável.


 Durante as perseguições, os cristãos se reuniam como podiam para celebrar os santos mistérios. Era mais frequente que essas reuniões ocorressem antes do levantar do sol. Quando foi dada à Igreja a alegria da paz, pôde-se ordenar a hora da Missa.


 Nos dias de festa e no domingo, ela era dita na terceira hora, ou seja, 9 horas da manhã. Nos dias de jejum, a Missa era dita por volta da nona hora, ou, três horas da tarde.


 É em lembrança deste uso que, nas igrejas onde se recita o ofício canônico, se diz a Missa dos domingos e dias de festa após a Terça, que é o ofício da terceira hora, ou nove horas da manhã. Nos dias de jejum ordinário, é após a Sexta, e durante a quaresma é após a Nona. Sexta e Nona eram o ofício do meio dia e das três horas da tarde.


 CO-CELEBRANTES . A liturgia dos primeiros séculos nos mostra o bispo e o altar cercado por outros bispos ou padres, que ofereciam o Sacrifício conjuntamente com ele e comungavam de sua mão. Isso ocorria, sobretudo, nas grandes solenidades, e diversos concílios prescrevem aos padres de se abster da celebração privada dos santos mistérios, e de assistir o bispo na sede episcopal. Este costume edificante etraçava admiravelmente o que o divino Salvador fez com seus Apóstolos na véspera de sua paixão.


 O antigo uso dos co-celebrantes se conservou na Igreja de Lyon. Nas Missas pontifícias ou mesmo nas Missas solenes, há sempre seis ou quatro padres assistentes revestidos dos hábitos sacerdotais. Enquanto o pontífice está sentado sobre a cadeira episcopal, os padres sentam-se a seu lado; quando ele sobe ao altar para a celebração dos santos mistérios, eles sobem com ele e ali permanecem sob seus olhos, do lado da epístola e do evangelho.


 Desta co-celebração, encontramos alguns vestígios na Missa ordinária, na sagração dos bispos e na Missa da quinta-feira santa. Nas Missas solenes só nos foi conservado um padre, que sob o nome de assistente se põe atrás do celebrante. Sendo um bispo, dois padres assistentes ficam ao seu lado durante o santo Sacrifício


 MINISTRO SERVINDO O ALTAR . O celebrante, nos tempos antigos, era assistido sempre por um diácono, mesmo para as Missas que, durante as perseguições, se diziam sem assistência. As oblações sagradas, tornando-se mais conhecidas, acabaram impossibilitando o acompanhamento de um diácono por padre, e os concílios decretaram que o diácono deveria ser sempre um clérigo tonsurado, revestido da sobrepeliz.


 O último concílio que trata desta matéria, o de Avignon, tido em 1594, estabeleceu que um leigo só servisse na missa, havendo necessidade. O concílio de Aix, em 1585, estabelece que sendo impossível a presença de um clérigo, se obtenha do bispo a permissão escrita para um leigo auxiliar na missa.


 Essas santas funções são, em nossos dias, comumente realizadas pelas crianças (acólitos).

PLANO E DIVISÃO

Dois métodos se oferecem (para a explicação das cerimônias da Missa): considerando o primeiro, no augusto Sacrifício - a paixão do Salvador - cada cerimônia representa uma circunstância desse drama doloroso.


 No segundo método, a Missa é a representação perfeita de todos os mistérios de Jesus Cristo: de sua Encarnação, Natividade, de sua santíssima vida, de sua Paixão, de sua Morte, de sua Ressurreição e de sua Ascensão. Representação tão perfeita, diz o padre Molina, que o próprio Cristo ali assiste, realmente em pessoa.


 Dos dois métodos, adotamos o segundo, mais completo que o primeiro. Contudo, ao dar preferência a esse plano, não passaremos inteiramente em silêncio sob a explicação da Missa segundo a paixão. Esse contexto virá, por sua vez, garantir que nosso quadro seja completo. Falemos das augustas autoridades em favor do método adotado aqui, citando algumas delas ao leitor desejoso de conhecê-las. Primeiro, temos o grande papa Inocêncio III: a ordem da Missa, diz ele, se acha disposta em um plano tão bem concebido, que as coisas feitas por Jesus Cristo ou se reportando a Ele, desde que Ele desceu do céu até sua subida, estão contidas ali em grande parte, seja em palavras, seja em ações admiravelmente representadas.


 Se é verdade, diz por sua vez o padre Nouet, que a vida de Jesus Cristo não foi mais que uma Missa solene, que começa na manjedoura e termina sobre o Calvário, posso dizer que a Missa não é senão a vida e a morte de Jesus Cristo, cujo mistério durará até a consumação dos séculos.


Gavantos, Lebrun, Olier, Rodrigues, partilham do mesmo sentimento. O testemunho dos antigos liturgistas vem ainda corroborar esta interpretação. A Igreja grega, sinaliza Bento XIV, oferece o santo Sacrifício em memória da Encarnação, da Natividade, da Paixão, da Ressurreição, da Ascensão e da Vinda do Espírito Santo, cujos mistérios são renovados na Missa. A liturgia Moçárabe exprime o mesmo pensamento por uma cerimônia cujos sentidos não pode escapar a ninguém. Na fração da hóstia consagrada, o padre a divide em nove partes; sobre cada uma delas um nome está escrito: Encarnação, Natividade, Circuncisão, Epifania, Paixão, Morte, Ressurreição, Ascensão, Triunfo, para indicar, por uma representação sensível, que Jesus Cristo, realmente presente sobre o altar, acaba de renovar, em sua própria carne, os mistérios de Nazaré, de Belém, do Calvário, do santo Sepulcro e do monte das Oliveiras.


 Que amor deve inspirar os santos mistérios considerando-o sob este ponto de vista, uma vez que, no espaço de meia hora, somos as felizes testemunhas do que viram, há dezoito séculos, Maria e José, os pastores e os magos, os Apóstolos e as santas mulheres?


 Tal é o plano que vamos desenvolver. Três épocas dividem a vida de Nosso Senhor, a Missa, que é seu memorial, deve naturalmente compreender três partes:


 A primeira, desde o Intróito até o Credo, responde à vida oculta e pública de Nosso Senhor até a instituição da Eucaristia;


 A segunda, do Credo até o Pai Nosso, compreende a paixão de Jesus Cristo ou sua vida dolorosa.


 A terceira, do Pai Nosso até o último Evangelho, abraça a vida gloriosa.


 O Culto Católico Em Suas Cerimônias e em Seus Símbolos – Abbé A. Durand. Tradução: Robson Carvalho.



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