Dom Lourenço Fleichman OSB
Se viver mergulhado no
mundo não leva ninguém para o inferno, pergunto: porque a porta do céu é tão
estreita? Porque N. Senhor insiste com essa idéia, ao dizer que é mais fácil um
camelo entrar no fundo de uma agulha do que um rico entrar no céu? É claro que
não se trata aqui, apenas de um homem que possui muitos bens. Rico é aquele
apegado às coisas, aos bens materiais, ao conforto, ao mundo. Um homem que
centraliza sua vida nas coisas desse mundo. Fica, de fato, quase impossível
entrar no céu carregado de tantos apegos, vaidades, orgulhos e vícios.
Do seu lado, os santos
insistem sempre: levem uma vida piedosa; o católico deve guardar sua vista, seus
sentidos para evitar todo pecado; vivam com modéstia, na castidade.
Não é bem esta a prática
atual, onde os católicos não diferem em nada dos mundanos. Assistem aos mesmos
programas de televisão, freqüentam os mesmos shows, as mesmas festas; gastam seu
dinheiro no mesmo comércio anunciado pela mídia: Natal com Papai Noel, Páscoa
com ovos e coelhinhos, e essa gama impressionante de festas inventadas para
ocupar o lugar das tradicionais festas religiosas e dos santos: dia das mães,
dia dos pais, dia dos namorados, dia da criança, dia do zumbi, dia do black
power, dia das bruxas... Quando acabaram com os feriados nos dias santos de
guarda, diziam que atrapalhava o trabalho. Como mentem! Mentem e manipulam as
cabeças de todos, mesmo daqueles que lêem jornais cults todos os dias e compram
o "Código da Vinci". Grandes culturas! São porquinhos mansos indo pelo curral em
direção à morte. E não percebem nada.
Naquele tempo se
praticava virtudes
Houve época em que o mundo
se pautava pela prática das virtudes. Que o homem fosse católico ou não, o
critério de sua vida seria o mesmo: cada qual trabalhava para ser reconhecido
pela sociedade como pessoa honesta, honrada, homem de palavra, fiel. Virtudes
como a coragem, a castidade, a piedade estava na pauta do dia. Se era católico,
praticava essas virtudes voltadas para a vida eterna, virtudes sobrenaturais. Se
não era católico, praticava essas mesmas virtudes sem a marca divina, eram as
virtudes naturais. Não diferem em si das primeiras, apenas nessa qualidade
divina que dá à virtude sobrenatural uma nova força, vinda de Deus, que conduz o
homem ao seu fim último, em Deus. Que ele fosse um médico ou um jurista, soldado
ou quitandeiro, dono de terras ou colono, todos se gabavam de dar a seus filhos
a boa educação, de corrigir seus filhos malcriados, de ensinar aos filhos a
prática das virtudes. Qual o pai que não se orgulhava de ver sua filha prendada
tomar bom marido, recomeçando assim o ciclo virtuoso da família decente? Não
eram santos, por certo. Mas quando pecavam ficavam com a consciência culpada
diante de Deus e
tinham medo de serem mal-vistos na sociedade.
O drama que estamos
vivendo vem do fato de que o mundo atual não se pauta por estes critérios de
vida. Homens "iluminados" introduziram um novo eixo no pensamento da humanidade.
Este novo eixo levou Gustavo Corção a entender o mundo moderno como "antropo-excêntrico",
ou seja, um mundo que trocou o seu eixo.
Hoje se pratica a
liberdade
O pólo desarticulador do mundo veio da falsificação da liberdade. A prática da
virtude passou a ser vista como obstáculo à liberdade. No pensamento
greco-católico, a liberdade é uma faculdade do espírito inteligente que o faz
mover-se para o bem por um movimento interior da própria pessoa, e não empurrada
por alguma outra força. Ora, só existe verdadeira liberdade quando nos
inclinamos para o bem. Quando os homens passam a ensinar que a inclinação para o
mal também é válida, estabelecem as bases para uma nova civilização: o mundo sem
Deus, o mundo sem virtudes, sem piedade.
O resultado é
catastrófico. Nada ficou de pé na nova civilização. Não somente a Igreja
Católica foi alijada de qualquer influência no pensamento moderno,
como a simples prática das virtudes naturais perdeu qualquer respaldo. Se
perguntarmos como vivem os homens deste nosso século, logo teremos uma lista das
novas atitudes:
- o reino do sexo livre,
sem qualquer tipo de limite tanto pela natureza quanto pela cultura. Forma-se
uma pressão sobre todos para que se acostumem a romper com os limites da própria
consciência. Esta pressão vem pelos programas de televisão, pelos filmes, pela
presença constante diante dos olhos, de imagens sensuais espalhadas pelas
cidades. É um dado positivo (no sentido de afirmativo) que vem somar a uma
impressionante propaganda negativa que há décadas faz uma verdadeira lavagem
cerebral, convencendo a todos que a castidade seria uma doença.
- o reino do erro livre,
onde todos têm razão e ninguém é dono da verdade porque expulsaram a verdade.
Expulsaram das suas vidas a autoridade divina, pois todas as religiões passam a
se valer; expulsaram a autoridade paterna, pois um pai não pode mais corrigir
seu filho, educá-lo na prática das virtudes condenando seus erros. O mundo onde
cada qual constrói sua própria verdade é um mundo esquizofrênico. Como a
inteligência humana se alimenta da verdade dos objetos que conhece, entra em
colapso quando é forçada a criar verdades de dentro para fora, sua própria
consciência passando a dar vida às coisas, o que é propriamente “tornar-se como
deuses”.
- o reino da desonestidade
livre, pois é evidente que não cabe no mundo tantas verdades individuais
opondo-se umas às outras. Por isso o colapso da verdade gera o ódio, a guerra,
inimizades. Não pensem que algum tipo de governo ou de partido poderá escapar da
corrupção. Ela é endêmica, faz parte essencial da vida onde a liberdade é deusa.
Lá onde a verdade movia os homens ao amor, temos hoje o erro movendo os homens
ao ódio. Na política como dentro das empresas, nas famílias como no mundo
jurídico.
- o reino da infidelidade
livre, pois a falsa noção de verdade e o falso amor geram uma relação social
evolutiva, chacoalhante, em constante movimento. Nada fica de pé, nada tem
aparência de duração, de solidez, de eternidade. Neste mundo não há lugar para a
família. Por isso podemos dizer que o Divórcio foi a bomba de retardo lançada no
mundo todo, que detonou a seu tempo sobre os alicerces da família, base da antiga
sociedade.
Tudo isso está invadindo
as casas há mais de cinqüenta anos, sem que os católicos reajam. O liberalismo
já tinha minado as bases da família. Poderíamos dizer que o liberalismo fez o
trabalho de sapa e a liberdade enlouquecida fez o trabalho de restauração da
casa destruída, com novas bases. O pior de tudo não é o mundo ser assim; o pior
é ver os católicos vivendo no meio disto sem enxergar; cegos, surdos, sem
forças, marionetes burrificadas por cinqüenta anos de estupidez televisiva.
Na formação deste
impressionante “Reino” do mal, algumas armas foram usadas de modo mais
constante:
- a imagem, essa rainha da
falsidade que escraviza a nossa imaginação, marca, fere, choca, tirando dela
toda reação possível.
- o som, que trouxe ao mundo vários tipos de música que simplesmente destrói na alma qualquer capacidade de raciocínio, de concentração.
- a ocupação, escravizando o homem numa avalanche de preocupações, de trabalhos, de excitações que o obriga a estar 24 horas por dia "ligado" na coisa material. Ao mesmo tempo, através de décadas de mentiras, arrancaram a mulher do seu trabalho materno, do seu lar, onde sua presença era a maior garantia da boa educação dos filhos.
- a diversão, que vem preencher o resto de tempo que os pobre-coitados ainda poderiam dispor: agora é hora de malhar, de correr, de praticar esportes cada dia mais exigentes. E tem o show alucinante, a festa que termina pela manhã, a praia, a viagem, o carnaval.
Pobre gente. Já não
conseguem entender as coisas mais banais. Já não percebem que os frutos dessa
nova civilização já estão estabelecidos como práticas consagradas:
- o aborto que mata a
criança inocente, contraponto dos famigerados "estatutos" da criança que protege
o marginal de baixa idade.
- a eutanásia, que é o
aborto dos velhos, tão indesejados pelo "custo" quanto os filhos. Temos como
exemplo gritante desta prática o assassinato de Terri Schiavo no início de 2005,
executada pela fome e pela sede com carimbos dos juizes e da polícia.(Leia
mais sobre este tema)
- o casamento homossexual,
que choca a natureza, contraponto das vantagens que a lei outorga aos
concubinatos. Chegamos ao ponto mais baixo na destruição da sociedade.
- vários detalhes da
chamada bio-(sem)ética, onde homens levam o delírio até experimentos com
genética humana, verdadeiros alucinados brincando de Deus. Seria o caso de
perguntarmos:
porque querem matar as crianças inocentes e, ao mesmo tempo, gerar
artificialmente seres humanos? Não podemos deixar de incluir aqui a aberração
dos embriões congelados que ninguém quer, seres humanos que sofrem sem piedade e
que serão destruídos cruelmente.
Em todos esses exemplos a
família aparece destruída. Já não é mais a base da sociedade. Os homens que
construíram isto que está aí detestam a família, odeiam qualquer cheiro de
tradição familiar, de fidelidade conjugal, de casa cheia de crianças.
Ora, se esses são os
critérios e as práticas da nova civilização anti-cristã, então somos obrigados a
constatar: o mundo está pronto para o Anti-Cristo!
O mundo está
pronto para o Anti-Cristo
Sempre me pareceu
impressionante a facilidade com que a humanidade segue apaixonadamente o
Anti-Cristo, que é uma das bestas, no relato divino
do Apocalipse.
Dizia-me: como pode ser que os homens se entreguem a uma vida completamente
enganadora e destruidora de tudo? Hoje ficou mais claro para mim. E muito me
impressionou ao encontrar no Pe. Castellani, grande pensador argentino, uma
descrição feita em 1953 disso tudo que só hoje estamos vivendo:
“... porque o Homem do Pecado tolerará e se aproveitará de um cristianismo adulterado...Imporá por todas as partes o reino da iniqüidade e da mentira, o governo puramente exterior e tirânico, a “Liberdade” desenfreada dos prazeres e diversões, a exploração do homem; e seu modo de proceder hipócrita e sem misericórdia. Haverá em seu Reino uma estrondosa alegria falsa e exterior, cobrindo o mais profundo desespero.
Em seu tempo acontecerão os mais estranhos distúrbios cósmicos, como se os elementos se houvessem revoltado. A humanidade estará numa grande expectativa e reinará grande confusão e dissipação entre os homens. Rompidos os laços de família, de amizade, de lealdade e bom relacionamento, os homens não poderão confiar em ninguém, e correrá no mundo como um tremor frio, um universal e ímpio “salve-se quem puder”. Será atropelado o que há de mais sagrado e nenhuma palavra terá mais fé, nem pacto algum terá vigor, senão pela força. A caridade heróica de alguns fiéis, transformada em amizade até a morte, manterá no mundo ilhotas de fé; porém mesmo ali, ela estará continuamente ameaçada pela traição e pela espionagem. Ser virtuoso será um castigo em si mesmo e como uma espécie de suicídio”.
Parece-me evidente que os
processos políticos atuais geraram um mundo sem lideranças. Não há verdadeira
liderança nos atuais países porque todo o jogo político local obedece a ordens
que não entendemos nem ouvimos. E não há, também, uma liderança mundial, porque
o lugar ainda está vago. É o lugar dele, do Anti-Cristo. Quando este homem do
pecado determinar que chegou a hora de aparecer, será certamente ovacionado por
toda a humanidade, pois falará a mesma linguagem, terá o mesmo pensamento de
todos, sobre tudo isso que citei acima. Sua ideologia, sua política, sua
ciência, tudo corresponderá ao que os homens pensam e praticam já hoje. Por isso
podemos dizer sem medo de errar. O mundo está pronto.
Não estou aqui a dizer que
o fim do mundo está próximo, ou que o Anti-Cristo seja tal ou tal pessoa. O que
me interessa nestas linhas é que os verdadeiros católicos tenham consciência do
perigo que correm se mergulharem no mundo. Se acharem que podem viver com estes
critérios que lhes são impostos, correm o grave risco de serem enganados pelo
grande líder, quando este chegar. Algumas pessoas poderiam objetar que podemos
conviver com todos e permanecermos católicos. Mas eu os alerto para essa
diferença radical entre o mundo de hoje e o mundo de cinqüenta anos atrás: lá,
no final da civilização cristã, ainda era possível viver assim porque os homens
tinham aquele critério da prática das virtudes, para suas próprias vidas e para
os seus filhos. Mas hoje já não é assim. Portanto, estejam armados, de espada em
punho, pois aquele que não combater, que não desviar seu pensamento das falsas
idéias, que não fugir das práticas absurdas, blasfematórias, ultrajantes para
Deus e sua Igreja, pode enredar-se na fina malha que já foi lançada sobre os
homens e que os arrasta para o reino do Anti-Cristo, que não é outro que o reino
das trevas. Está na hora de reler algumas páginas dos santos e doutores da
Igreja:
“Estas são as marcas da vinda do Anti-Cristo:
Quando os velhos não tiverem nem bom senso nem prudência,
Quando os cristãos estiverem sem fé,
Quando o povo estiver sem amor,
Quando os ricos forem sem misericórdia.
Quando os jovens não tiverem respeito,
Quando os pobres forem sem humildade,
Quando as mulheres tiverem perdido o pudor,
Quando, no casamento, não houver mais continência,
Quando os clérigos forem sem honra e sem santidade,
Quando os religiosos não tiverem verdade nem austeridade,
Quando os bispos não se inquietarem de sua administração e não tiverem piedade,
Quando os mestres da terra não tiverem misericórdia nem liberdade”.
E o Padre Emmanuel, grande
espiritual do sec. XIX:
“Apresentar-se-á como cheio de respeito pela liberdade dos cultos, uma das máximas e uma das mentiras da besta revolucionária. Dirá aos budistas que é um Buda; aos muçulmanos, que Maomé é um grande profeta... Talvez até irá dizer, em sua hipocrisia, como Herodes seu precursor, que quer adorar Jesus Cristo. Mas isso não passará de uma zombaria amarga. Malditos os cristãos que suportam sem indignação que seu adorável Salvador seja posto lado a lado com Buda e Maomé em não sei que panteon de falsos deuses”
Impotentes que somos
diante de tal situação, só podemos olhar para a Virgem Maria, para seu Coração
Imaculado, e suplicar a ela que nos proteja contra toda influência do maligno.
Que nos dê a mão, que nos acolha em seu Coração. É preciso fincar o pé, recusar
ser arrastado como um cordeirinho para a destruição de nossa personalidade, de
nossa fé, de nosso espírito. É preciso ler, estudar, conhecer a verdade
objetiva, clara, de Deus, do mundo, do pensamento. É preciso amar. Amar na ordem
da Caridade, ou seja, amar como Deus nos ordena, praticando os mandamentos,
cumprindo nosso dever. E nossos deveres são de três ordens: para com Deus, para
nós mesmos, para com o próximo.
É preciso, com toda
urgência, praticar a devoção reparadora dos pecados cometidos contra o Imaculado
Coração de Maria. Fazer os Primeiros sábados do mês, rezar o Terço todos os
dias, para que, ao chegar o Anti-Cristo, estejamos recolhidos e protegidos por
nossa Mãe do Céu. Com a espada em punho, lançaremos contra o rosto tenebroso do
homem do pecado o grito de Viva Cristo Rei! Imaculado Coração de Maria,
salvai-nos! E Jesus Cristo o vencerá “com o sopro da sua boca”.
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