sábado, 1 de novembro de 2014

A meditação sobre a morte


 Deverás enfrentar a morte, talvez mais brevemente do que pensas.

Como o farás? Hoje estás vivo. De repente, não mais.

Ausente, desaparecerás também muito depressa da lembrança dos outros.

Como é cego e duro o coração que só vê o presente em detrimento do que é certo no futuro!
Dada esta certeza, deverias levá-la em conta sempre todas as circunstâncias.

 Se tivesses a consciência tranquila não temerias a morte.


Dá mais certo evitar o pecado do que fugir da morte.

Se hoje não estás preparado, por que o estarias amanhã? Não é sempre incerto o futuro?

Que adianta viver muito e pouco se corrigir?

A vida longa muitas vezes só faz aumentar a culpa em vez de dar ocasião de correção.

Quem dera pudéssemos viver bem nesse mundo, nem que fosse um único dia!

Somam-se muitos anos de vida com pouquíssimos frutos de conversão.

Morrer é um risco, mas viver muito tempo pode ser ainda mais perigoso.

Feliz quem leva sempre em conta a eventualidade da morte e para ela se prepara diariamente.

Já viste morrer alguém. Pensa que o mesmo te acontecerá.

De manhã, pensa que podes não chegar ao fim do dia. Posto o sol, não apostes que verás amanhecer.

Vivendo assim, estarás preparado, e a morte nunca te surpreenderá.

Muitos morrem de morte súbita e inesperada, pois o Filho do Homem virá quando menos se pensa (Lc 12,40).

Nesse momento extremo começarás a ver com outros olhos tua vida passada e te lamentarás de ter sido tão negligente e tão frouxo.

Como é prudente todo aquele que procura viver como se estivesse no momento da morte!

O desprezo do mundo, o desejo ardente de praticar a virtude, o amor da sobriedade, a penitência contínua, a obediência pronta, a negação de si mesmo e a disposição de tudo suportar por amor de Cristo nos tornam plenamente confiantes na hora da morte.

Enquanto tens boa saúde, podes fazer de tudo; mas não sei se o poderás ao te enfraquecer.

Poucos melhoram enfraquecidos, como poucos se santificam multiplicando as romarias.

Não confies tua salvação à interferência de amigos ou de parentes, nem a deixes para amanhã. Mesmo a quem estimas logo se esquece de ti.

Convém antes prever a tempo e começar fazendo o bem, sem ficar à espera de qualquer auxílio.

Se não te cuidas agora, quem cuidará de ti no futuro?

Agora é o tempo precioso, o momento favorável e o dia da salvação (2 Cor 6,2). É lamentável que o desperdices e deixes e deixes de merecer a vida eterna!

Chegará o momento em que precisarás de um dia ou até de uma hora para te corrigir, e não se  obterás.

Coragem, meu caro, se alimentasses agora o temor e previsses a morte, liberta-te-ias de seus grandes perigos e evitarias suas terríveis ansiedades!

Procura viver de modo a não temer a hora da morte, mas até te alegrar.

Aprende a morrer para as coisas do mundo e saberás então viver para Cristo.

Aprende agora a tudo desprezar, e poderás então seguir a Cristo.

Castiga teu corpo com penitências, e gozarás, então, por certo, da plena intimidade com ele.

Insensato, como pensas que poderás viver ainda muito tempo, se não tens a garantia nem mesmo de um único dia?

Quantos se iludiram e foram arrancados do corpo quando menos esperavam!

Vemos todos os dias que um tal morreu pela espada, outro se afogou ou quebrou a nuca, morreu comendo ou jogando, outro foi atingido pelo fogo, pela lança ou pela peste, outro, enfim, foi vítima de ladrões.

Assim, o fim de todos é a morte e a vida humana como uma sombra que passa (Sl 144, 4).

Quem se lembrará de ti depois da morte, quem rezará por ti?

Faze, meu caro, faze logo o que podes fazer por ti, pois não sabes quando vais morrer nem o que pode te suceder depois da morte.

Investe nas coisas imortais enquanto tens tempo.

Pensa principalmente na tua salvação. Cuida somente do que é de Deus.

Cultiva a amizade dos santos celebrando-lhes as festas e imitando-lhes as virtudes, para que, depois desta vida, te recebam nas moradas eternas (Lc 16:9).

Vive como peregrino e hóspede nesta terra, sem se imiscuir nas coisas mundanas.

Guarda o coração livre e voltado para Deus, pois não temos aqui cidade permanente (Hb 13:14).

Dirige para lá, diariamente, com lágrimas, teus clamores, orações e teu espírito, na morte, se transferirá como que naturalmente para junto de Deus.

 

Imitação de Cristo – Tomás de Kempis

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