Marco Tosatti para First Things. Tradução de Airton Vieira
Quando o cardeal
Gerhard Müller foi destituído de seu posto no Vaticano, o principal
objetivo do círculo que rodeia Francisco foi o Cardeal Robert Sara, prefeito da
Congregação para o Culto Divino. Seu último golpe é a publicação de uma carta
de “correção” dirigida ao Cardeal Sara e assinada por Francisco. Publicado no
domingo, a carta foi celebrada como uma humilhação justa do cardeal e acompanhada
de chamadas para sua renúncia.
A princípios deste outono, Francisco emitiu Magnum Principium, um documento que outorga às conferências
episcopais uma maior liberdade para fazer suas próprias traduções de textos
sagrados e liturgia. O cardeal Sara respondeu com uma carta que oferecia uma leitura
limitada do documento, preservando o mais possível o poder de Roma para evitar más
traduções (como o desejo dos bispos alemães de traduzir pro multis como “para todos”, em lugar de o corrigir
“para muitos”).
Francisco declarou publicamente que Sara está equivocado, e que o Magnum Principium reduziu o
poder de supervisão de Roma.
Esta é uma humilhação calculada ao Cardeal Sara – e
não só a ele. Ao Papa Bento XVI, também, já que ele é o grande campeão da
“reforma da reforma”, um intento de corrigir as inovações litúrgicas que seguiram
ao Concílio Vaticano II. E de São João Paulo II, que em 2001 emitiu o
documento Liturgiam Authenticam, que Francisco
tratado de destruir com Magnum Principium.
O cardeal Sara sofreu uma humilhação similar há pouco
mais de um ano, depois de que instou aos bispos e sacerdotes a celebrar o ad orientem da
missa, mirando rumo ao leste, segundo a antiga prática da Igreja. Este foi outro
esforço para avançar em “reformar a reforma”. O cardeal afirmou que havia falado
com Francisco sobre o tema, e que ele havia dado seu assentimento à proposta. Se
é assim, o Vaticano não fez nenhum reconhecimento deste fato em sua nota de
negação contundente.
Outra humilhação
ocorreu quando Francisco eliminou a maioria dos membros existentes da Congregação
para o Culto Divino e os substituiu com personas que são mais hostis a Sara e seus
pontos de vista litúrgicos. E está o assunto da “Missa Ecumênica”, uma liturgia
desenhada para unir a católicos e protestantes em torno à Mesa Santa. Ainda que
nunca se anunciou oficialmente, um comitê que informa diretamente Francisco esteve
trabalhando nesta liturgia durante algum tempo. Certamente, este tema está
dentro da jurisdição da Congregação para o Culto Divino, mas o Cardeal Sara não
foi oficialmente informado da existência do comitê.
Segundo boas fontes, o secretário de Sara, Arthur
Roche - que ocupa cargos opostos aos de Bento XVI e Sara - está envolvido,
igualmente a Piero Marini, o homem de confiança de Monsenhor Bugnini, autor de obras
tão notáveis como A Igreja no Irã e Novus Ordo Missae.
A esses nomes, agregue o Subsecretário de Culto
Divino, Corrado Maggioni, e um profano, o liturgista extremadamente “progressista”
Andrea Grillo. Recentemente, Grillo atacou duramente Bento XVI depois de que o
Papa escreveu no prefacio de um dos livros de Sara que com Sara, “a liturgia está em boas mãos”. E Grillo
atacou a Sara, chamando-o “incompetente e inadequado”.
Se Grillo se
comporta tão grosseiramente, deve ser porque está seguro de estar protegido por
amigos em lugares altos.
Agora,
sabemos que Francisco não se preocupa muito com a liturgia, e provavelmente não
lhe importa muito este tema tão particular. Mas sua orientação ideológica geral
é não tradicional, e ele tende a pôr-se do lado da parte da Igreja que se chama
progressista enquanto busca um regresso à década de 1970: os bispos da Alemanha,
Bélgica e Inglaterra.
Algumas
destas figuras agora estão pedindo a cabeça do Cardeal Sara. Mas isto é pouco
provável que suceda. Foi Francisco quem nomeou Sara Prefeito do Culto Divino em
novembro de 2014. Se quer substitui-lo, deve esperar ao menos dois anos, quando
o mandato de Sara de cinco anos chegará a seu fim. Então os autodenominados reformadores
que formam o “círculo mágico” para a liturgia devem suportar pacientemente a
presença e a atividade do Cardeal, que não tem medo de lutar, nem sequer sozinho.
Por suposto,
o partido progressista no Vaticano tem outro motivo para atacar o Cardeal Sara.
Em dezembro, Francisco cumprirá oitenta e um anos. Os cardeais já estão
pensando em um futuro conclave. Um dos homens considerados como mais suscetíveis
é o cardeal Secretário de Estado, Pietro Parolin, quem parece estar distanciando-se
de alguns dos aspectos mais questionáveis do reinado de Francisco. E outro é o cardeal
Robert Sara, conhecido por sua santidade de vida e sua falta de interesse em qualquer
forma de poder ou coerção, incluso na Igreja.
Ademais, a África
é o continente onde a Igreja cresce mais dramaticamente, e onde a fé se pratica
amiúde até o ponto do martírio. Nada poderia ser mais apropriado que o próximo
Papa proviesse desse continente. E assim chegamos à grande ironia da campanha
para desacreditar a este calado e sofredor eclesiástico. O cardeal Sara é
atacado precisamente porque é visto como possuidor das qualidades de um Papa.
Marco Tosatti
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