Uma opinião
muito compartilhada entre muitas mães é que: “ a criancinha não compreende as
faltas nem as correções , e por isso é inútil ocupar-se a gente dela quando não seja para acalente-la, admirá-la e
enfeitá-la. É tão cômoda esta opinião, e gostamos tanto da comodidade hoje em
dia! Graças a ela podemos mimar e adular nossos filhos com a consciência
inteiramente tranquila, gozar duma felicidade que não se compra, e desfrutar
alegrias sem passar por tristezas: coisa tão rara neste mundo, que a consideraríamos,
também preciosa, se a julgássemos segura.
Essa teoria
tão natural tranquiliza a consciência, satisfaz o coração e tira à fraqueza
todos os motivos de hesitar. Principia a mãe em lisonjear e desenvolver com
todas as suas forças os maus instintos que julga fácil reprimir com firmeza ao
adiante. Afasta o trabalho afirmando enfaticamente da obrigação de realizá-lo
mais tarde, e tem para o futuro uma severidade de princípios tanto maior,
quanto mais quisera aturdir-se e cegar os outros a respeito da fraqueza do
presente.
Compreendem
bem pouco essas pobres mães as provações que a si mesmo preparam; não sabe o
que lhes há de custar o primeiro não
quero; não suspeitam onde pode chegar a resistência nesses entesinhos
acostumados a não ceder a ninguém.
Impulsionadas
então pelas íntimas censuras da consciência, e humilhadas pelos defeitos
manifesto de seu filho, é possível que tente executar esse trabalho que, para
consideração para com seu amor próprio, teriam feito melhor em anunciar menos
pomposamente; e travarão entre o seu coração e as paixões da criança combates
que reclamarão a reunião de todas as suas forças. Porém, habituada a criança a
vencer todos os obstáculos, se alguma vez os encontrou, sustentará
valorosamente a luta, e também reunirá todas as suas forças; e, como diminuirão
necessariamente as da mãe à proporção que aumentem as dela, é fácil predizer
para que lado se inclinará a vitória.
Cansada então
a mãe destes ensaios tão infrutíferos e penosos, já não dirá: A criança não compreende; mas dirá
consigo: Não posso dominá-la. Triste
e tênue consolação, principalmente quando ajunta baixinho a consciência: Mas podia fazê-lo! Então lamentará o passado, chorará o
presente, e talvez ainda queira cerrar os olhos ante o futuro.
Mas a
criança, pela sua parte, mais que nunca certa de seu poder, como um rei a quem
subministraram os inimigos, atacando-o, ocasião de consolidar o trono por meio
de novas conquistas; a criança, conhecedora de sua força tratará a mãe como
vencida. Não pedirá novas concessões, mas, tomá-la-ás. E se a mãe tentar depois
alguns esforços, como a criança já saberá contê-los, contê-lo-ás. Toda criança possui essa espécie de
inteligência, à qual sabe ajuntar uma energia incrível, quando veem que é
possível o triunfo.
Esta alma
infantil que quer conquistar com suas paixões sublevadas o direito de
governar-se a si mesma, é como o povo excitado por falsas ideias de liberdade,
e já sabemos que excessos ele é capaz. Ali como aqui, são sempre governos
fracos e condescendentes aqueles contra quem se ergue a rebelião, acusando-os
de despóticos.
Não a
aniquiles mas, submete-a, dirigi-a e domina-a. Leva-a primeiro à escola da
obediência, e depois à da fé (a fé
precede a razão para a formar, e a razão segue a fé para a firmar). Saiba a
criança praticar o bem antes de o discutir
e explicar e verás que para os fazer compreender não há nada como a
prática. Por isso disse o discípulo amado do Salvador com uma profundeza de
pensamento que desafia a gramática: Aquele
que FAZ a verdade chega à luz.
Curva-lhe o pescoço enquanto é jovem e
castigue-o com varas enquanto ainda é criança.(Eclesiástico). Os germes das paixões
podem vir a ser árvores corpulentas. Ao cabo de alguns meses, já sabe a criança
gritar e impacientar-se quando encontra
oposição; porém acham graça a estas cóleras infantis, provocam-na às vezes,
rindo-se delas, e depois cedem, se é que não alcançou tudo no primeiro grito.
Ah! Em
verdade a criança não é um joguete, e em mãos cristãs deverá ser sempre um
objeto respeitável e sagrado. Então, em vez de rir, dever-se-ia refletir; em
vez de admirar, dever-se-ia obrar; em vez de atiçar o fogo, dever-se-ia apagar;
e em vez de ceder, dever-se-ia resistir.
E ai de ti,
mãe imprudente, se, depois de uma longa e valorosa resistência, concedes ao fim
às suas importunidades o que julgares ao
princípio dever recusar, porque não esquecerá a criança. Certa de conseguir o
seu fim por meio da perseverança, não há dúvida de que a terá, e tu pagarás
muito caro a fraqueza de um momento.
Há até certos
caracteres que mostra esta obstinação e este zeloso amor da independência, sem
que nada os tenha animado neles. Parece que ao entrar na vida lhes fez ouvir a
voz da serpente do Éden o grito de guerra e rebelião, o non serviam que balbuciam antes de poderem falar.
Contra estes
é insuficiente uma resistência passiva, se a autoridade não presta auxílio o
castigo, a vara recomendada pelo Espírito Santo. E esta vara, que tão dura é
para a mão maternal, deve ela saber mostrá-la e aplicá-la, embora lhe doa o
coração se volva o rosto, a despeito da vontade, para chorar a firmeza do
braço. Quem castiga o seu filho cura-lhe
as feridas da alma, ainda que se lhe comovam as entranhas a cada grito que ele
solte (Eclesiástico).
Força, é mal
que nos pese, vergar esses caracteres inflexíveis; força é que encontrem uma
vontade ainda mais tenaz que a sua; e quando, depois de terem lutado por muito
tempo, se encontrarem sempre no mesmo ponto; quando virem que todas as suas
rebeliões, vão bater de encontro a um poder que não cede; exaustos pelos
esforços, convencidos de sua insuficiência, aceitarão o freio que se lhes
impuser para o mastigarem, é possível e até provável, a princípio; mas com o
tempo se desgostarão dos furores concentrados como dos outros, e, acalmados os
primeiros momentos de efervescência, começarão a compreender o valor da
submissão, o benefício da sua educação e o afeto de sua mãe, a qual agradecerão
as suas correções, bendizendo-a, com toda efusão do conhecimento.
Sim, aquele que poupa o castigo odeia o seu
filho, e aquele que o ama aplica-se a corrigi-lo. (Provérbios). Não poupeis a correção à criança, pois não
morrerá se o castigares com a vara.(Provérbios).
Sem embargos,
para acabar a sua obra ser-lhe-ão poderosos auxiliares certas precauções pueris
na aparência. Assim, não deixar nunca sem resposta as perguntas multiplicadas e
até embaraçosas do menino terrível, para
servir do termo que traduziu tão engenhosamente
a caricatura na linguagem seria; participar dos seus contentamentos,
interessar-se pelos seus brinquedos, tomando às vezes parte neles, escutar
atentamente a narração das suas emoções e dos seus dissabores ; não abusar,
especialmente, sobre pretexto algum, da
sua ingênua credulidade, e até defendê-la contra as tentativas de
outrem. É necessário que reconheça tal infalibilidade da mãe. Mas permiti-lhe
que pergunte as razões da ordem que se lhe dá, tolerar discussões e
resistências fundamentadas, é embrenhar-se numa espécie de livre exame prático;
é criar um livre-pensador em embrião, o qual, habituado a regatear a sua
obediência à mãe, a recusará talvez um dia a essa outra mãe, cuja
infalibilidade se acha garantida pela mesma palavra de Deus.
Não, não, não o façais senhor das suas
ações desde a infância. (Eclesiástico).
Obedeça ao princípio e mais tarde se lhe poderão fazer chegar aos ouvidos os
motivos do mandado, sem que toda via pareça que está prestando satisfações.
Deste modo contrairá o hábito da submissão plena, sem prejudicar a cultura da
razão.
Primeiro de
tudo não esqueçamos que: Se o Senhor não
edificar sua casa, em vão trabalham os construtores. Ora, pois, mãe cristã,
para não trabalhares em vão; ora quando, só na presença dessa alma infantil tão
pura, encaras os teus deveres e a imensa responsabilidade que sobre ti faz
pesar esse depósito sagrado. Ah! Seria demasiado pesada a carga se não viesse
em teu auxílio Aquele que se revestiu das nossas misérias para nos ajudar a
levá-las. Não quis o próprio Jesus Cristo ter necessidade de um ajudante para
subir ao calvário?
Se vaidosa e
presumida, a mulher perecerá, se julgar tão forte que não necessita de auxílio
e tão elevada que não deve pedir. Perecerá sob o peso da maldição de Deus,
desse Deus protetor da lâmpada expirante. Perecerá, porque Deus, que salva a
quem o implora, nunca prometeu o seu auxílio ao que não pede; perecerá, porque
ele aborrece os soberbos; perecerá, e seu filho com ela.
Mas não, Deus
meu, não perecerá! A oração é uma necessidade do coração que sempre será
recordada pela sua miséria. Confiando na vossa paternal bondade e na palavra do
santo Evangelho , orará com esperança e fé e acompanhará de lágrimas a oração
que vos dirigir; e desaparecerão os escolhos e lhe renascerá o amor no coração
e , cheia de amor não lhe assustarão os inimigos.
Mas tu que
amas teu filho, tu cuja esperança provém da fé, não ores só. Jesus Cristo ama
nos céus as criancinhas como as amou na terra, e não só te diz ainda: Deixe-as vim à mim, senão quer que lhas
conduza tu. A tua primeira lição ensine a teu filho a juntar e erguer ao CÉU as
mãozinhas suplicantes. Saibam os lábios murmurar, antes de qualquer outra
palavra, o nome divino de Jesus e o nome bendito de Maria. Seja o primeiro
exercício da sua memória uma oração, e faça-lhe compreender o primeiro uso da
sua inteligência que deve amar seu Pai celestial mais que a ti própria.
Estas
impressões que se gravam sem apagar coisa alguma, também não se apagam:
encontram-se sempre como fiéis aliados, e acolhem-se como amigos da infância.
Talvez sejam as únicas que resistem na efervescência das paixões, à perniciosa influência
dos maus princípios, bem como a ação corrosiva dos maus exemplos.
Ah! Se visse,
enquanto ora a criancinha com sua fé virginal e sua cândida inocência, que
olhares de amor deixa Deus cair sobre os puríssimos perfumes deste incenso, com
que ternura se inclina para escutar este
balbuciar inarticulado, e sem embargo
tão inteligível para Ele. Se a mãe sentisse sua própria felicidade e
compreendesse a de seu filho , só ela lhe ensinaria esta ciência das ciências ,
e nunca ele se ajoelharia senão com ela.
Não é menos
importante a escolha dos amigos, pois, muitas mães, frequentemente procedem com
uma inconsequência difícil de
compreender. Estas mães afadigam-se muito para serem bem sucedidas nas
educações que empreendem; não retrocedem para realizar sacrifício algum e,
contudo, nada adianta. A proporção que se entrega a este laborioso trabalho
destroem-no com igual perseverança porque os perigosos amigos cujo trato
habitual toleram, efetuam a tarefa de
demolição com tanto zelo quanto elas empregam em construir.
Ao passo que
a mãe apresenta a obediência como uma necessidade e como uma ventura, os amigos
inculcam a insubordinação e as vantagens da resistência. A mãe educa na polidez
e doçura, riem-se os amigos da primeira e abusam da segunda.
Atualmente, em
que as mulheres abandonaram o lar para trabalhar na rua, como se educar o filho
não fosse trabalho tem mais: as babás temem as queixas, o rancor e as acusações
das crianças pois sabem que estas queixas e acusações deixam sempre uma
impressão desfavorável no ânimo dos pais. Em consequência disto, querem elas
também fazer a corte ao tirano em miniatura; e não tendo para isso meio mais
seguro que o de favorecer-lhes os caprichos e o despotismo, acabam se unindo a
ele.
Escolhendo a
teu filho uma companhia de sua idade e de sua classe, educada nos mesmos
princípios e com os mesmos cuidados, fará
realmente melhor e mais feliz. Na falta dessas relações, serve-lhe tu
mesma de companhia e amiga, não permitindo as outras senão raros a intervalos.
Sê severa com
a fraude e a hipocrisia; nunca te rias duma mentira, por mais hábil que seja,
porque algumas vezes é prudente cerrar os olhos a certas faltas, não pode
conceder-se a esta sem perigo tal anistia.
Vela
especialmente sobre ti mesma, para que a tua retidão guie, no meio dos
hipócritas que encontrarão em todas as idades. Nunca te gabes de ter enganado
alguém, nem permita nunca a outros que o façam na presença da criança. Ai!
Muitos te ensinarão um dia esse vício; mais ai daqueles que escandalizam estes
pequeninos tão queridos do Senhor.
A criança
aproveita-se, para se instruir, quase igualmente do que se diz e faz diante
dela, e do que se diz e faz para ela. E, pois, é necessário respeitar sumamente
os olhos e os ouvidos das crianças.
Se
conseguires fazer teu filho amar a verdade ainda quando criança, se aprender a
dizê-la a muito que lhe custe, quando homem a encontrará tão formosa que a não renegará;
e, graças a essa fiel e luminosa amiga, chegará a ser uma das raras exceções de franqueza e lealdade que refulgem na terra
como estrelas caídas do céu.
Guarda-te
também dessa admiração mal disfarçadas que deixam transparecer muitas mulheres
a cada palavra ou cada ação de seu filho, o que poderia ressoar de novo a
censura dirigida por Deus ao sacerdote Heli: Porque amastes a teus filhos mais do que a mim? (Livros dos Reis).
Quando a mãe vai procurando por todas as partes : cita diante dela seus ditos
engraçados, provoca-os e comenta-os; a civilidade exige que os outros aplaudam:
chamam batendo palmas, o pequeno ator já tão cheio de si; bradam-lhe bis a cada grito agudo, repetem-nos,
riem-se e falam deles. Não é preciso mais nada para transformar uma cabeça
juvenil, vazia de qualquer outra coisa, e muito disposta a encher-se de
vaidade. Lisonjeia teu filho, diz o
Espírito Santo, e te causará grandes
temores, e por fim te fará ranger os dentes. (Eclesiástico).
A MULHER CRISTÃ, desde o nascimento até a morte - M.me M. de Marcey.
Nenhum comentário:
Postar um comentário