O Brasil tem protagonizado nas últimas semanas a tentativa de implantação da ideologia do gênero por meio da Votação do Plano Nacional de Educação.
Nessa última quarta-feira houve a terceira tentativa de votação na
câmara dos deputados, embora mais uma vez adiada, à causa, dessa vez, de
bate-boca e provocação de deputados contra os manifestantes pró-vida e
pró-família presentes na sala.
“Muitos têm desviado o foco do debate para temas que não pertencem ao
âmbito da ideologia de gênero”, disse à ZENIT o Pe. José Eduardo de
Oliveira e Silva, sacerdote da Diocese de Osasco - SP, pároco da Igreja
São Domingos (Osasco), doutor em teologia pela Pontifícia Universidade
Romana da Santa Cruz e professor de Teologia Moral.
Acompanhe a entrevista abaixo:
***
ZENIT: Temos visto nas últimas semanas um crescente debate
sobre a questão de “gênero” no contexto do Plano Nacional de Educação.
Como o sr. avalia estas discussões?
Pe. José Eduardo: Tenho acompanhado de perto os diferentes discursos e
percebo que, embora a questão esteja cada dia mais clara, muitos têm
desviado o foco do debate para temas que não pertencem ao âmbito da
ideologia de gênero, talvez até como um recurso para não enfrentarem um
tema tão absurdo. Trata-se de um deslocamento para sabotar o discurso.
ZENIT: Em que consiste, então, a “ideologia de gênero”?
Pe. José Eduardo: Sintetizando em poucas palavras, a ideologia de gênero consiste no esvaziamento jurídico do conceito de homem e de mulher. A teoria é bastante complicada, e uma excelente explicação desta se encontra no documento “Agenda de gênero”.
Contudo, a ideia é clara: eles afirmam que o sexo biológico é apenas um
dado corporal de cuja ditadura nos devemos libertar pela composição
arbitrária de um gênero.
ZENIT: Quais as consequências disso?
Pe. José Eduardo: As consequências são as piores possíveis! Conferindo status
jurídico à chamada “identidade de gênero” não há mais sentido falar em
“homem” e “mulher”; falar-se-ia apenas de “gênero”, ou seja, a
identidade que cada um criaria para si.
Portanto, não haveria sentido em falar de casamento entre um “homem” e
uma “mulher”, já que são variáveis totalmente indefinidas.
Mas, do mesmo modo, não haveria mais sentido falar em “homossexual”,
pois a homossexualidade consiste, por exemplo, num “homem” relacionar-se
sexualmente com outro “homem”. Todavia, para a ideologia de gênero o
“homem 1” não é “homem”, nem tampouco o “homem 2” o seria.
ZENIT: Então aqueles que defendem a “ideologia de gênero” em nome dos direitos homossexuais estão equivocados?
Pe. José Eduardo: Exatamente! Eles não percebem que, uma vez aderindo
à ideologia de gênero, não haverá sequer motivo em combater à
discriminação. Nas leis contra a discriminação, eles querem discriminar
alguns que consideram mais discriminados. Contudo, pela ideologia de
gênero, não há mais sentido em diferenciar condições e papeis, tudo se
vulnerabiliza! Literalmente, eles caíram no conto do gênero.
Para defender a identidade homossexual, estão usando uma ideologia
que destrói qualquer identidade sexual e, por isso, também a família, ou
qualquer tipo de família, como eles mesmos gostam de dizer.
Em poucas palavras, a ideologia de gênero está para além da
heterossexualidade, da homossexualidade, da bissexualidade, da
transexualidade, da intersexualidade, da pansexualidade ou de qualquer
outra forma de sexualidade que existir. É a pura afirmação de que a pessoa humana é sexualmente indefinida e indefinível.
ZENIT: Então a situação é muito pior do que imaginamos...
Pe. José Eduardo: Sim. As pessoas estão pensando em “gênero” ainda
nos termos de uma “identidade sexual”. Há outra lógica em jogo, e é por
isso que ninguém se entende.
Para eles, a ideia de “identidade sexual” é apenas um dado físico,
corporal. Não implica em nenhuma identidade. Conformar-se com ela seria
“sexismo”, segundo a própria nomenclatura deles. A verdadeira identidade
é o “gênero”, construído arbitrariamente.
Todavia, este “gênero” não se torna uma categoria coletiva. É
totalmente individual e, portanto, indefinível em termos coletivos. Por
exemplo, alguém poderia se declarar gay. Para os ideólogos de gênero
isso já é uma imposição social, pois a definição de gay seria sempre
relativa a uma condição masculina ou feminina mormente estabelecida.
Portanto, uma definição relativa a outra, para eles, ditatorial.
Não existiria, tampouco, a transexualidade. Esta se define como a
migração de um sexo para outro. Mas, dirão os ideólogos de gênero, quem
disse que a pessoa saiu de um sexo, se aquela expressão corporal não
exprime a sua identidade construída? Portanto, para eles, não há sequer
transexualidade.
Gênero, ao contrário, é autorreferencial, totalmente arbitrário.
Alguém dirá que não há lógica isso. Realmente, a lógica aqui é “ser
ilógico”. É o absurdo que ofusca nossa capacidade de entender.
ZENIT: O que dizer, então, de quem defende a ideologia de gênero no âmbito dos direitos feministas?
Pe. José Eduardo: Os ideólogos de gênero, às escondidas, devem rir às
pencas das feministas. Como defender as mulheres, se elas não são
mulheres?...
ZENIT: Qual seria o objetivo, portanto, da “agenda de gênero”?
Pe. José Eduardo: Como se demonstra no estudo que mencionei, o grande
objetivo por trás de todo este absurdo – que, de tão absurdo, é
absurdamente difícil de ser explicado – é a pulverização da família com a
finalidade do estabelecimento de um caos no qual a pessoa se torne um
indivíduo solto, facilmente manipulável. A ideologia de gênero é uma
teoria que supõe uma visão totalitarista do mundo.
ZENIT: Como a população está reagindo diante disso?
Pe. José Eduardo: Graças a Deus, milhares de pessoas têm se
manifestado, requerendo dos legisladores a extinção completa desta
terminologia no Plano Nacional de Educação. Pessoalmente, tenho
explicado a muitas pessoas a gravidade da situação nestes termos: 1)
querem nos impor uma ideologia absurda pela via legislativa; 2) querem
fazê-lo às custas do desconhecimento da população, o que é inadmissível
num Estado democrático de direito; 3) e querem utilizar a escola como um
laboratório, expondo nossas crianças à desconstrução de sua própria
personalidade. E ainda querem que fiquemos calados com isso! Não!, o
povo não se calará!
ZENIT: Falando em “Estado democrático de direito” e vendo a
manifestação de tantos cristãos, evangélicos e católicos, inclusive de
bispos, alguns alegam a laicidade do Estado como desculpa para desprezar
os seus argumentos. O que dizer sobre isso?
Pe. José Eduardo: Esta objeção é tão repetitiva que se torna
cansativo respondê-la. Numa discussão democrática, não importa se o
interlocutor é religioso ou não. O Estado é laico, não laicista,
anti-religioso. Seria muito divertido, se não fosse puro preconceito – e
às vezes, verdadeiro discurso de ódio anti-religioso –, a insistência
com a qual alguns mencionam a Bíblia, os dogmas, os preceitos... como se
nós estivéssemos o tempo todo alegando argumentos teológicos. Como se
pode ver acima, nossos argumentos aqui são simplesmente filosóficos,
racionais. Aliás, são tão racionais a ponto de mostrar o quanto a
proposta deles é totalmente irracional, posto que contradizem as sua
próprias bandeiras ideológicas.
No final das contas, a única coisa que lhes resta é a rotulação – na
audiência de ontem, chamaram aos gritos um deputado de “machista”, em
outra ocasião de “patricarcalista” –, mas a rotulação é a arma dos
covardes, daqueles que não têm honestidade e liberdade intelectuais.
Como digo sempre, nestas discussões, precisamos nos comportar como
filósofos, e não como maus advogados, que estão dispostos a negar até as
evidências.
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