segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Archbold sobre "Promover o Cisma"





14/12/18 16:32 por One Peter Five

Nota do tradutor: Duas questões pontuais gostaria de fazer menção. A primeira, menos importante, é com relação ao desfecho, totalmente dispensável, dado por 1P5 neste artigo, posto que o que de fato importa não é o que pensamos, mas se estamos dispostos a encarar o tema com a seriedade e premência devidas. A segunda, mais importante, é com relação ao tema em si, que, diria, com coragem profética é trazido à tona por Patrick Archbold, ainda que muito dele já se vislumbrasse lá atrás. Aqui não se trata mais de discordar ou concordar, como de estudar, aprofundar, escafandrar o assunto com olhar reto e objetivo, pois os inimigos da fé não dormem, e o caminhão já está virando a curva para nos bater de frente, e, atentos!, ele não é nada pequeno. Digo-o não por mera opinião, que de nada vale, mas, entre outros, por ter sido testemunha ocular de um dos fatos aqui mencionados, o da “visita oficial sul-americana...”. E, creiam-me, não é algo nada agradável de se vivenciar.

Tradução de Airton Vieira* – Em seu blog de sempre, Creative Minority Report, Patrick Archbold, o colaborador de 1P5 e de Remnant, escreveu um artigo dividido em cinco partes sobre “promover” o Cisma na Igreja. Alguns de vocês vão querer lê-las todas, mas gostaria oferecer-lhes uma versão resumida ao modo de introdução.

Na primeira parte, Archbold começa com uma citação atribuída ao Papa Francisco em 2016 –informada aqui— na que supostamente disse, “Não há que excluir que [eu] possa entrar na história como o Papa que dividiu a Igreja Católica.”

“Esta citação”, escreve Archbold, “é de Der Spiegel. Mas é o correspondente do Spiegel na Itália, Walter Mayr, quem apresenta essa declaração como autocrítica. Baseando-me em todas as provas até o presente momento e no que creio que possa vir, suspeito se tratar de uma má interpretação da declaração. O Papa não estava sendo autocrítico, estava contando-nos seu plano”.
Estava contando-nos seu plano.

Durante anos, parece que algo que muitos comentaristas católicos não foram conscientes ao tratar de entender com o papado atual é que as gafes, os erros bem intencionados, as irregularidades e incluso a absoluta incompetência não explicam o fenômeno Francisco.
A intencionalidade explica.
Não posso ler os corações e as mentes, e certamente não posso ler as almas. Mas posso dizer aonde aponta a evidência. E todos os indícios que tenho observado mostram que Jorge Mario Bergoglio, o homem que chegou a ser o Papa Francisco, examina a Igreja Católica tal como se encontra agora com as ideias de destruição e reconfiguração no primeiro plano de seu pensamento.
Archbold utiliza como ponto de partida as manipulações evidentes nos dois Sínodos da Família, além do fato consumado, meridianamente claro, [do] que foi o Sínodo da Juventude de outubro passado. Archbold escreve,
Não somente eliminaram todas as regras de antemão e encheram o Sínodo de gente maleável, como que em realidade publicaram um documento sinodal que tratava substancialmente de um tema sequer tratado no Sínodo, a sinodalidade em si mesma. Devemos lhes conceder: são os hereges drogados. Simplesmente não lhes importa.


Archbold argumenta que a intensificação de manobras no Sínodo se produziu em resposta direta aos “católicos fiéis” que falaram “muito claramente e lhes causaram mais problemas dos que estão dispostos a suportar”. Sim, está falando de você e de mim, entre outros. Sua tese é que a Igreja “esteve de fato em um estado de cisma durante algum tempo”, mas embora os que rejeitassem o ensino da Igreja se negassem a ir, agora “estão no comando”.
“Eles não queriam fazer sua própria Igreja”, escreve Archbold. “Queriam a nossa. Agora têm o poder e o usam”.
A pergunta que engloba tudo é a seguinte: como se desfazer dos católicos que se opõem? Ou, mais concretamente, como converter um cisma de fato em um real?
Na segunda parte, Archbold argumenta que os que têm agora o poder na Igreja “estão implementando mecanismos que não darão quartel aos católicos fiéis”. E por ‘não dar quartel’, se entende que
… estão dando uma série de passos destinados a colocar os católicos fiéis, especialmente os católicos tradicionais[1], no rincão onde eles querem exatamente que estejamos. Em resumo, estão executando uma série de jogadas de seu livro de estratégias para pôr os católicos tradicionais em uma posição na que devam capitular ou ser desobedientes em algum grau. Buscam a desobediência.
Sua teoria é que este mecanismo –a desobediência forçada– se empregará para “separar os católicos tradicionais da Igreja”.
Ele dá exemplos: os Freis Franciscanos da Imaculada, uma visita oficial sul-americana empregada para tirar um bispo simpático à Tradição que havia criticado outros bispos de sua região, a eliminação—nunca explicada oficialmente– do bispo Martin Holley de Memphis (Holley parece crer que foi um castigo por um desprezo anterior, do cardeal Wuerl, caído em desgraça mas ainda forte), a “visita e destruição” das Petites Sœurs de Marie Mère du Rédempteur, quem, diz Archbold, “cometeram o duplo delito de ser um pouco ‘conservadoras demais’ e possuir alguns bens que o Bispo local cobiçava”, assim como a Ordem soberana e militar de Malta.
Provavelmente há mais que poderia se agregar à lista.
“Seja uma ordem de inclinação tradicional”, escreve Archbold, “os moderadamente conservadores, ou incluso um bispo que não aceita o programa, a mensagem e o método são claros: quando querem que se vá, podem fazer que se vá”.
Recentemente, diretrizes adicionais de Roma fizeram com que se torne ainda mais difícil para essas pessoas recorrer quando são tratadas injustamente. Incluso os bispos, não raro indicados por Francisco como aqueles que devem decidir em suas regiões, agora necessitam uma permissão de Roma antes de erigir institutos de vida consagrada em suas dioceses, algo que os bispos sempre tiveram o poder de fazer.
A terceira parte da série de Archbold se centra no que está se fazendo com a vida religiosa. Diz, citando a Hilary White, que algumas das mudanças nas regras introduzidas pelo Vaticano recentemente assinalam “o fim da vida monástica contemplativa”. Cita a Hilary ademais em referência à natureza vital dos religiosos enclaustrados, e vale a pena repeti-lo aqui:
Uma vez que se enclaustram, o mundo se esquece deles. Mas a vida religiosa contemplativa é como as mitocôndrias da Igreja, a fonte de energia da célula que faz que todos os outros sistemas funcionem. As mitocôndrias são as mais discretas e ocultas dos orgânulos do corpo, e durante muito tempo sua função não se entendeu completamente. Mas agora sabemos que nossas vidas dependem da saúde desta pequena coisa secreta e oculta. E a doença mitocondrial –quando as mitocôndrias não funcionam–é devastadora.
Não irei ao nível de detalhe de Archbold, mas ele destaca uma série de indicadores de que “o Papa Francisco claramente não gosta das ordens contemplativas” e atua em consequência. “A vida monástica católica tradicional”, conclui, “está acabada. Não pode e não sobreviverá a este ataque, se algo não mudar”.
E não se trata só de acabar com as coisas. Se trata de exterminar as que começam. Pensem sobre isto:
Pouco a pouco, estão destruindo as vias para que os religiosos pratiquem o catolicismo tradicional. Simplesmente não estão deixando aos católicos tradicionais com vocação nenhum lugar para ir, exceto aonde eles querem que vão. Estão cortando diligente e sistematicamente todas as vias de escape. Isto é fundamental para entender minha tese sobre como podem em um futuro [próximo] causar a divisão na Igreja, pela que o Papa Francisco vem definhando abertamente.
quarta parte da série trata sobre a “sinodalidade”, o estranho e mal definido conceito que foi o principal ponto do Sínodo da Juventude; um tema do que, como argumenta Archbold, nem sequer era tratado no Sínodo. Em lugar de tentar resumir, citarei aqui com mais detalhe:
Os meios católicos aprovados pelo comitê executivo lhe dirão que a sinodalidade tem a ver com descentralizar o governo da Igreja, para que seja mais próxima à gente em forma de Conferência Episcopal. Isto, obviamente, não poderia estar mais longe da verdade. Em uma incrível validação da mentira, antes de que se secasse a tinta do documento do Sínodo sobre a sinodalidade, o Papa interveio pessoalmente para castrar publicamente a USCCB (Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos), antes de que sequer se pensasse em discutir inutilmente sobre o escândalo de abuso sexual. Foi todo um espetáculo, inclusive para observadores veteranos da Igreja.
Para compreender de que se trata a pressão para a sinodalidade, deve se observar o padrão descrito anteriormente. Em cada passo, restringem o direito dos bispos e outros grupos a atuar por sua conta e sob sua própria autoridade de forma que colida com o super-dogma do ‘Vaticano Segundismo’. A sinodalidade não tem a ver com dar mais autoridade às Conferências Episcopais, como se demonstra inegavelmente em Baltimore. Se trata de restringir a capacidade de qualquer bispo individual para atuar por sua conta. Se trata de assegurar que nenhum bispo ortodoxo extraviado possa ser um bastião da Tradição e um espaço seguro para o catolicismo tradicional. Não pode permitir que novos grupos de religiosos se formem em sua diocese, não pode convidar as monjas tradicionais a se instalar em sua diocese, e se fizer algo demasiado tradicional, receberá uma visita apostólica pelo crime de não estar ‘em comunhão’ com sua Conferência Episcopal. Tudo isto foi para cortar todas as vias de escape aos católicos tradicionais.
Archbold reconhece que esta última linha não é “totalmente certa”. Este é o ponto crítico:
Algumas vias de escape foram deixadas abertas. Abri este ensaio com uma citação de Sun Tzu, “A um inimigo sitiado, deves deixar-lhe uma via de escape”. Corta todas as vias de escape menos uma. Coloca teus inimigos em um só lugar fazendo-lhes crer que não há outro lugar aonde ir.
Archbold cita em seguida uma história que tratamos aqui há um par de semanas, na que um bispo na reunião da Conferência Episcopal Italiana (CEI) em novembro atacou o Summorum Pontificum e sua afirmação de que a missa latina tradicional nunca foi ab-rogada e, portanto, permitida em todas as partes.
Tal como especula Archbold, esta permissão universal para celebrar a Antiga Missa sem uma permissão do ordinário local ou de Roma “é o que se deve eliminar. Esta é uma escotilha de escape que simplesmente não podem tolerar”. Continua:
Como converter um cisma de fato em um real? Como conseguir que os católicos fiéis, vistos de fora, aparentem estar em cisma? Para cercar o inimigo, deves cortar todas as outras vias de escape. Deves conseguir que os católicos tradicionais e os conservadores autênticos se encontrem todos em um lugar onde se sintam mais seguros, antes de desferir o golpe…
Creio que têm a intenção de acabar com o Summorum Pontificum e o direito individual dos sacerdotes de dizer a Missa e obrigar a todos os católicos tradicionais a uma ou umas poucas fontes aprovadas, talvez a FSSP[2] e a ICRSS[3] ou alguma preparada comissão Ecclesia Dei, se não puderem fechar o acordo sobre a FSSPX[4].
Archbold chama isto de “o pote de mel, o lugar para reunir a todos os recalcitrantes sob um mesmo teto, onde esperem o golpe de misericórdia”.
Em sua quinta e última parte da série intitulada “A Queda do Martelo”, Archbold descreve como vê que isto sucederá.
Ele crê que Roma “fará que regressemos à era do indulto e nos consolidará em alguns grupos”.
Continua,
Afirmarão, e seus irmãos aduladores nos principais meios de comunicação católicos o repetirão, que isto não é um movimento anti-tradicional: “O Papa não eliminou uma só Missa tradicional, só se trata de governar”.
E quando tudo se acalme é quando o Papa desferirá o golpe. Não, não proibirá a Missa tradicional em latim completamente; não creio. Teria demasiadas repercussões e há uma maneira muito mais fácil de lograr seus objetivos. O Papa fará algo muito pior que proibi-lo. Irá mudá-lo. Irá mudar o Missal de 1962.
O Papa exercerá sua legítima autoridade para fazer um aggiornomento[5] no Missal de 1962. Talvez substituirá o lecionário pelo atual modificado há três anos, mudará algumas orações, permitirá a comunhão na mão ou alguma outra mudança que comova a consciência dos católicos tradicionais. Será o Vaticano II da Missa tradicional em latim. É o que dizem agora: “O Papa não proibiu a Missa em latim, simplesmente utilizou sua autoridade legítima sobre a liturgia para torná-la mais inteligível”.
Em sua visão predita da Igreja, Archbold diz que a consequência de tal ato é clara:
Qualquer grupo aprovado que resista às mudanças ou se queixe demasiado receberá a Visita apostólica e será esmagado por negar-se a se submeter ante o Pontífice. Qualquer comunidade diocesana com indulto que resista será esmagada. E o católico que pense poder passar à clandestinidade e simplesmente ter Missa na casa de alguém? Não. Os sacerdotes individuais já não terão direito a celebrar a Missa. Faça-o e te negarás a submeter à autoridade do Papa. Serás um cismático. Assim também com qualquer bispo. Ou aceitas a bota do Vaticano II em teu pescoço ou serás um cismático.
Qualquer tentativa de viver uma autêntica vida católica tradicional, seja como religioso, ou simplesmente assistindo a Missa de todos os tempos, o converterá em um cismático por defeito. Se vai à FSSPX, cismático. Se vai a uma Missa clandestina, cismático. Se forma um grupo de fiéis sob uma regra tradicional sem permissão de Roma, cismático. Converterão qualquer tentativa de viver uma vida católica tradicional em um ato de desobediência.

É uma lúgubre visão do que pode vir, mas [não obstante] não deixa de chover durante meses nas trincheiras, os bombardeios se produzem dia e noite, e quando parece que já perdemos a capacidade de crer em um novo horror, conjuram outro.
Sublinho aqui que a opinião de Archbold sobre isto é só uma teoria, e é bastante dura. Assim que pergunto aos leitores: Vocês o que pensam?
Steve Skojec
(Traducido por Rodrigo García García. Artículo original)
___________________
Fonte: https://adelantelafe.com/archbold-sobre-promover-el-cisma/

* Airton Vieira é autor de 500 anos de Reforma: um brinde!? (web) e tradutor de Sermões de São Vicente Ferrer: o Anticristo e o Juízo Final (Martyria, 2018).



[1] O original traz “tradicionais”. Um e outro termos são o que hoje podemos considerar “um mal necessário”, pois ou se é católico ou não se é. Ponto. A necessária distinção se dá diante do contexto hodierno em que “tradicionais” ou “tradicionalistas” se referem, ao contrário do que alguns pensam, não aos mais santos ou corretos em sua práxis, mas àqueles que tentam manter-se nos trilhos da doutrina apostólica, seguindo as Escrituras, mas em harmônica ligação com a Tradição e o Magistério, o “tripé” de sustentação de todo o edifício católico nestes quase dois mil anos de existência. Isto os faz manter tranquila – ainda que sôfrega – a consciência em relação a heresias, blasfêmias e sacrilégios, oriundos em menor ou maior grau da adulteração da sã doutrina (cf. 2 Jo I, 9).
[2] Fraternidade Sacerdotal São Pedro.
[3] Instituto Cristo Rei e Sumo Sacerdote.
[4] Fraternidade Sacerdotal São Pio X.
[5] Adaptação.

Um comentário:

  1. Texto brilhante. Muito clara a resistência às mudanças na e da Igreja, sobretudo em relação ao papa Francisco.Não faltam argumentos para isto. A sensação que fica é a de que realmente é preocupante a maneira como o comando da Igreja tem tratado a vertente tradicional ou conservadora, ou seja, os fiéis tradicionais. Parece evidente a intenção da igreja não só rechaçá-los, como também se livrar deles.

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